21 setembro 2011

Feridas Expostas [X]



















É um entra e sai que não há memória.
É um desgaste mais impróprio para consumo que mais parece que o ar deixou de estar poluído, para se incrustar no peito.
Nunca dantes o seu coração batera tão forte, de ansiedade, angústia, desespero, tristeza, vazio…?! Vá lá que ainda não desistira de bater. Perdera-se do rumo traçado depois de tantas fatalidades imberbes.
E, neste caso as novidades só vinham transportar a alma, por defeito, para uma cada vez mais sepulcral prisão.
Desengane-se quem ache que o coração não falece de dor, de tristeza, de desilusão… Morre muito mais do que se parasse de bater…
Lídia travara desde que se conhecia batalhas duríssimas.
E estava disposta, a qualquer custo, a destruir qualquer desânimo. Aliás, tudo o que se lhe afigurasse de carácter negativo teria que ser banido de vez da sua vida.
Nela, já não havia espaço para rancores ou falsas propensões para indefinições dos seres (des)humanos…
Com esta selecção (des)cuidada, sentia-se mais sóbria, mais serena, mais entusiasta da vida. Acabara-se o corpo presente em serviço de ambulatório.
As vertigens do mundo já não a atrapalhavam… Ganhara um caminho interminável cuja orientação era em frente, sem medo das tonturas que um andar mais perto das nuvens provoca…
Lídia, através de uma mudança de atitude perante a sua vida, tinha-se livrado do sentimento de marioneta moribunda, presa entre o mundo exterior e a palma das suas mãos…
Enfim, é sempre mais fácil perder o que de essência nunca se teve!
No início da sua transformação, meditava o porquê das bolas de sabão terem uma vida tão curta… Quanta beleza subjugada…!
E por falar em beleza, André chegara das aulas para lhe trazer sorrisos. O sol como ainda brilhava naquele fim de tarde, convidava Lídia a levar o miúdo a passear. Era o passatempo favorito de André, segurar a mão da mãe e calcorrear um qualquer caminho que se delineasse atravessar…
Com o anoitecer, o vento massajava-lhe a pele com displicência…
É o bom que a Natureza tem. Espraia os fios de cabelo e recolhe as (ex)tensões que atrapalham o dia-a-dia…
André acompanhava a mãe dando-lhe a pequena mão, num aperto de mão firme e ternurento…
Aquele momento tinha tanto de individual quanto de plural…
Tanto de solenidade etérea, quanto de encantamento perene…
O tempo e o espaço ficavam abandonados por completo, porque aquele era um momento metafísico de restituição umbilical…!
André tinha 9 anos e era um rapazinho amoroso. Na boca faltavam-lhe alguns dentinhos, mas não deixava de sorrir para quem o fazia feliz…
No percurso escolhido, não houve tempo para distracções, pelo menos até o telemóvel tocar numa pacata melodia. Era Jorge, o companheiro de vida, de alma, do amor que desde sempre decidiram partilhar… Acabara de chegar a casa e as saudades dos seus dois amores eram gigantescas...
Aprontara-se e correu ao encontro das duas criaturas da sua vida!
Jorge e Lídia formavam um casal feliz cujo lema sempre foi o de respeitar duas características basilares: ser-se sempre único e individual. Afinal, eram duas personalidades fortes unidas. Houve tempos em que estiveram mais exaltadas, mas sempre que alguma se retraía, a outra, desafiava-a a despertar e consequentemente a erguer-se, sempre numa luta comum. É na inversão de estados de espírito e na mútua harmonia que transpõe os desafios que todos os dias se apresentam, que reside o segredo de uma vida a dois…

13 setembro 2011

Feridas Expostas [IX]


São mágoas coercivas, aquelas que avistava naqueles olhos esverdeados e incisivos. Eles já não emanavam a beleza de outrora, apenas um sentimento pobre de afeição pelo tempo, pela saudade da vida.
Todas as suas forças haviam estagnado. Tudo o que a fizera feliz tinha terminado. Perguntava-se por diversas vezes, como se deixara entregar às teias absurdas da incompreensão, da letargia e da sórdida apatia?
Já não havia por que se martirizar com tantos equívocos… Mas continuara indefinidamente… Aqueles que ousaram estender-lhe uma mão amiga foram poucos. Sentiam-na uma perfeita desconhecida. E, concretamente, sentiam saudades do ‘antigamente’!
O passado tem destas iniquidades. O que éramos, pesar-nos-á sempre, quer nos pontos fortes, quer nos mais fracos. Por mais que gritemos aos quatro ventos que tudo mudou, a essência de cada um é provocadoramente uma patente certificada!
Desajeitadamente, erguias-te com fraca destreza. Tinhas passado bastante tempo sem alimento, sem uma gota de água que hidratasse o corpo. Sentias-te a afastar do mundo real. Os ansiolíticos não contornavam as dores da alma e já pouco faltava, para prever que se ninguém te acolhesse, deixavas-te levar nessa maré turva em que te enredaste…
Assim como existem necessidades vitais que devem ser alimentadas, estas também são passíveis de serem criadas. Se assim não fosse, o futuro do marketing e da publicidade estaria seriamente comprometido.
Arrancaras o fio do telefone, para que não tocasse. O telemóvel deixaste-o perdido até perder a bateria. Trancaste as portas. A TV permanecia em silêncio... A internet e tudo o que advém desse contacto à globalização tinhas ignorado em absoluto! Para quê tentar ajudar quem não quer ser amparado?
A história da vida lembra que todos têm telhados de vidro. Uns mais inquebráveis que outros (talvez fruto do carácter ou da personalidade impressa ao longo da vida). Mas lembra também que quando estalam fendas, próximo se estará de grandes palpitações. A hierarquia das fendas nunca é singular, muito pelo contrário é plural e desastrada. Falta saber quando vai começar a inquietação.
Assume-se sempre o controlo passível de ser tomado, simplesmente, por vezes, não é o devido… Não é à toa que vulgarmente se diz que ‘todo o cuidado é pouco’… Sem dúvida que há imensas variáveis capazes de promover a autodestruição, sem que vivalma dê conta!
Portanto, observe-se delicadamente as pessoas que dependem de nós, sem que saibamos. Diz que com o tempo se apura este sentido protector de quem realmente se traz no coração.
Hoje, já fez algum verdadeiro amigo sorrir?
Reconfortou nas suas asas alguém ou, precisa ser reconfortado?
Se é do último caso que padece, faça-se ouvir sem medo de falsas interpretações. Todos os ‘passos’ são válidos no caminho da auto-salvação!
Sim, é de partilha sem tempo nem espaço para censuras, aquilo a que me refiro…

Imagem: Pensamento de Fernando Pessoa

08 setembro 2011

Feridas Expostas [VIII]


















Chico Buarque cantou “a dor da gente não vem no jornal”. Acrescentaria: “nem estampada no rosto”. E por mais pistas que sejam dadas distraidamente, os enigmas são mais que muitos a desterrar.
Em alternativa, leva-se todo o padecimento para o derradeiro leito. Não se desfazem os sorumbáticos e ocultos mistérios de uma vida já excedida, de uma vida vagarosamente sentida...
Subsistem as memórias felizes, porque como o próprio nome indica, são as únicas capazes de sobreviver, pois lembram momentos de amor.
E, no amor é tudo parvo. Inconsistente. Doentio. Perverso. Infantil. Abnegado. Nos mais variados moldes de o sofrer!
Aliás, na travessia dos excessos que se praticam, não há limites. É mesmo assim. E se doutra forma fosse, não teria o mesmo impacto d’ alma, essa profunda fonte de luz.
Todos os estádios percorridos, trá-los no peito… Mesmo os dos socalcos intempestivos.
As feridas da vida são duros golpes quase sempre transponíveis.
A menos que se enraízem no corpo e sejam incapazes de quebrar a invencibilidade.
Há algumas que têm nomes esquisitos, mas grosso modo são uma praga, uma peste…
O silêncio distancia as dores. Acolhe a mágoa. Tempera a alma. Equilibra a balança dos dias…
E não Chico, isso não vem nos jornais. Apenas permanece em segredo. No segredo mais discreto possível. Também de que adianta partilhar se essa dor não desvanece?
Cair na permissividade de um lamento, é passar a vida de joelhos, frente a quem o escuta. Em contrapartida, se se demonstra controlo, o fenómeno será mais humilhante, as visitas passam a precisar de apoio e, o paciente a erguer duas cruzes!
Tudo o que vem em potência faz melhor a ultrapassagem.
E, as sucessivas ultrapassagens da vida tornam-nos um caminho mais maduro, recto, coeso e aprumado!
E Chico, também esta parte continua sem voz nas páginas do jornal…
Sem sombra de visibilidade. Sem cor na imagem. Sem uma única palavra refém de tinta cravada em papel reciclado…

07 setembro 2011

Dá-me Coceira!

 

Esboçam sorrisos de ignorância e relatam palavras num desalinho inconsciente. Balbuciam asneiras a jorro, que é como quem diz que se exprimem em vocabulário desconcertante, para quem aprecia a língua de Camões (ou o que vão fazendo dela)! Dão pontapés afirmativos na linguagem comum, com o condão de quem convive com a alucinação feita sombra, que vibra na boca com um volume inconstante, gradativo e exageradamente alto.
Jigajogam com o corpo que se mexe num ritmo conquistador (ou vá, parolo), em autênticas manifestações de seres assexuados vertiginosos.
Mostram pele às bandeiras despregadas, não norteiam combinações de roupas, acessórios e calçado. Quase merecem o prémio de melhor farrapo humano enfarpelado, face ao apurado sentido estético!!!
Pavoneiam-se em distintos subterfúgios financeiros, ao passo que pessoas comuns são incapazes de almejar uma pequena vitória. Isto está no sangue, não está?!
Frustrem-se todos aqueles que se relaxam a observar os movimentos destas criaturas, sem as ouvir! Mas como não há uma sem duas, nem duas sem três, recomenda-se que não queiram ouvir os conteúdos fúteis em tom de vácuo que abordam.
Após esta nota (des)cuidada, questiono se essas figuras terão noção daquilo que despertam nos outros? Sentirão a vida a passar itinerante e alheia à adversidade? Serão mais ou menos audazes? Que sabor provam da felicidade? Quais as suas defesas?
Solta-se uma ‘poliresposta’ aplicada: Não sei! Provavelmente são um fenómeno em ascensão digno de estudo.